4 PERGUNTAS A… Fernando Vasco*

1- Fernando, olhando para a sua caminhada, vejo um médico empenhado em causas; um médico com perfil humanitário agindo junto das populações mais vulneráveis. Quando é que iniciou este caminho ou o que o levou a segui-lo?

Estamos em 1971 (4º ano de Medicina). Eu e a minha namorada, mais tarde mãe dos meus filhos, resolvemos passar a frequentar uma equipa do Serviço de Urgência do Hospital de S.José como voluntários. O nosso objectivo era aprender. O cenário de horror e violência com que nos confrontámos no Banco marcou-nos para sempre (doentes aglomerados e abandonados em macas aglomeradas nos corredores, os gemidos e os chamamentos, as más condições de trabalho dos profissionais, o equipamento degradado). Nessa noite, chegados a casa, a minha namorada rompeu em choro convulsivo. Desde esse dia nunca mais calei o meu posicionamento face à forma como os indivíduos são tratados nos serviços de saúde. Mais tarde, em 74/75, a experiência vivenciada no Serviço Médico à Periferia, no concelho de Odemira, reforçou a ideia de que há gente que não tem voz e necessita de ajuda. Percebi também que a batalha da saúde não se ganha nos hospitais, mas sim junto das comunidades.

2- Vivemos num tempo diferente e muito preocupante em termos de saúde – hoje todos somos vulneráveis. Esta crise sanitária global fez aumentar os pedidos de ajuda?

Fez aumentar os pedidos de ajuda quer individuais, quer dos serviços públicos.

3- É Presidente da MÉDICOS DO MUNDO PORTUGAL e numa situação como a atual, de pandemia, onde se centra a vossa ação?

Durante a pandemia a MdM não parou. Procurámos não perder o foco, mantendo o apoio às populações mais vulneráveis, nomeadamente garantindo-lhes o acesso aos cuidados básicos de saúde. Fizemos um plano de contingência e orientámo-nos por ele. O pessoal da sede passou a homeworking. As equipas deixaram a rua e passaram a prestar cuidados de saúde nos locais em que as pessoas em situação de sem abrigo foram confinadas. Isto nas cidades de Lisboa, Porto e Barcelos. Atualmente as equipas já retornaram à rua. Estamos a voltar lentamente à normalidade. Vale a pena dizer, que face à pandemia muitos voluntários apareceram para trabalhar. Os nossos profissionais e voluntários, a quem a MdM muito deve, correram riscos para ajudar outros. Infelizmente vários contraíram o vírus, outros tiveram que ficar de quarentena e, infelizmente, tivemos um óbito, o que muito nos afetou. Não tem sido fácil para ninguém.

4- Faz parte da Ser Mais Valia desde o seu início, participou na formação da associação e é um membro bastante ativo; já partiu em missão e, recentemente, esteve na Guiné numa missão exploratória. A MÉDICOS DO MUNDO e a SMV o que têm em comum?

Eu diria que temos um objetivo comum. “Dentro das nossas possibilidades, ajudar quem necessita”. Solidariedade e ativismo são valores que nos unem.

 

*FERNANDO VASCO é médico especialista em Saúde Pública, Presidente da ONG Médicos do Mundo Portugal e associado da SMV.

Tem um longo percurso profissional e de voluntariado, tendo estado em várias partes do Mundo, em zonas de grande vulnerabilidade. E, tal como afirma: «…percebi que a batalha da saúde não se ganha nos hospitais, mas sim nas comunidades.»

O seu lema de vida, conforme lemos na entrevista: «Dentro das nossas possibilidades, ajudar quem necessita».

É um voluntário muito valioso.

 

Recolha de Isabel Amorim
Voluntária da SMV