Dia Mundial da Justiça Social

JUSTIÇA SOCIAL, para todos?

 

Porque se fala tanto de Justiça Social? Que inquietação é esta que trouxe este tema para o quotidiano dos cidadãos? Que valores balizam a visão que se tem das relações entre iguais/desiguais? Até que ponto as questões sobre a Justiça Social estão condicionadas por um mundo que surpreende todos os dias?
A Justiça Social, e temas afins, tem preocupado instituições ao mais alto nível, de tal forma que foi criado o Dia Mundial da Justiça Social, que se celebra todos os anos em 20 de fevereiro.
Esta data foi criada em 2007 pela Assembleia Geral das Nações Unidas e tem como objetivo trazer ao debate alguns dos problemas mais prementes que se enfrentam nas sociedades hodiernas como sejam a pobreza, o desemprego, a exclusão.
Tenta-se, a partir deste debate, desenvolver novas oportunidades para todos, que permitam vir a reduzir as desigualdades. Estas desigualdades patentes no mundo têm estado na origem das maiores injustiças, como é do conhecimento geral.
A igualdade, o bem-estar, o trabalho e a realização da justiça para todos são algumas das preocupações presents na celebração desta data, mais evidenciadas numa altura em que se levantam questões tão sensíveis como a das migrações e dos refugiados. Questões estas que nos invadem diariamente, seja por aquilo que os media nos informam (ou desinformam), seja por tudo o que se observa e se vivencia. “Vemos, ouvimos e lemos não podemos ignorar”, como nos alerta Sofia de Mello Breyner.
O entendimento do que é a Justiça Social implica logo à partida uma mudança de atitude que comporte por exemplo uma atitude de oposição à discriminação negativa, não se aceitando o domínio de uns sobre os outros; procurar-se o reconhecimento da diversidade, dado que não há duas pessoas iguais e essas diferenças devem ser valorizadas; entender-se a pertinência de se estar a favor de uma distribuição equitativa dos recursos e ainda fomentar-se a oposição a práticas injustas, estimulando-se contextos de solidariedade, como uma das estratégias de mudança possível.
Vive-se num Estado de direito, e por essa razão espera-se e deseja-se que o Estado providencie a proteção de todos os indivíduos como seres humanos de direitos, isto é, numa relação de igualdade e dignidade que se possa apelidar de cidadania.
Mas será o papel atribuído ao Estado uma garantia da realização da Justiça Social? Já se viu que não! Ainda é grande o grau de insatisfação. Pensa-se muito na realização da Justiça Social principalmente como resposta às necessidades no campo da aquisição de bens materiais, sejam essas respostas o acesso a bens de primeira necessidade e sobrevivência, uma habitação condigna, alimentação, proteção na saúde e antes de mais o acesso a um trabalho que providencie a autonomia económica e financeira de cada pessoa para que não fique a viver dependente das esmolas ou ajudas alheias. Por mais bem-intencionadas que estas ajudas sejam, elas são sempre um fator de humilhação para quem as recebe.
As necessidades de educação e formação merecem neste texto uma referência em particular, dado que são aqui entendidas como transversais a todas as outras necessidades, e devem-se considerar como necessidades básicas. Só a partir do acesso a respostas condignas de educação e formação, cada pessoa será capaz de construir o seu perfil e encontrar percursos de vida estimulantes e de realização pessoal, que lhe irão permitir reais vivências de autonomia pessoal e emancipação.
Mas como garantir-se a resposta às necessidades básicas de cada ser humano?
No conceito de Justiça Social, e em termos da sua concretização, está implicada a ideia de uma redistribuição. Mas nem sempre todos precisam na mesma medida. A Justiça Social não pode entender-se numa única perspectiva, há que reconhecê-la como igualdade quando tratamos de forma igual todos os que estão em igualdade de circunstâncias e a Justiça Social como equidade quando tratamos os diferentes de forma diferente. Esta distinção obriga a que se tome em consideração a realidade específica de cada pessoa ou grupo de pessoas, de acordo com as suas necessidades para se fazer uma redistribuição realmente justa.
Segundo alguns autores, como John Rawls, é preciso que se estabeleça um contrato social para ajudar os membros mais “fracos” da sociedade, procurando construir-se instituições de proteção. É possível que as diferenças na sociedade não se anulem, segundo ele, mas pugnando-se por um princípio de uma justicça equitativa poderá oferecer-se o maior benefício para os membros menos favorecidos da sociedade.
Haverá portanto que estabelecer-se um contrato entre o Estado e as instituições para que assim procedam. Mas será que o Estado conhece realmente o que os cidadãos precisam?
Amartya Sen, economista, também muito atento às questões da justiça, vem introduzir um outro aspeto, alertando para a pertinência do papel de cada indivíduo na sociedade. Este economista apela a que o Estado providencie, antes de mais, condições de participação a cada cidadão para que ele seja agente constructor do modelo de sociedade que se deseja realmente justa, e não tenha de sujeitar-se a um qualquer modelo de redistribuição definido unilateralmente pelo Estado.
Segundo a visão que este autor partilha, poderá dizer-se que há que se “rasgarem” espaços de oportunidade para questionar, discutir e debater o que é a justiça social e que tipo de sociedade realmente justa se deseja.
O exercício da cidadania é isso mesmo: participar em prol de uma sociedade cada vez mais justa. Há que concretizá-lo em movimentos de cidadãos que se organizam em instituições, organizações, e/ou órgãos representativos, que pressionem da base até ao topo, para que se promovam novas alternativas, a legitimar por quem de direito.
Não abdiquemos de ter voz e lugar!

20 Fevereiro, 2020
Graça Maria André
Assistente Social *

* Doutorada em Serviço Social e docente do ensino superior.